Capítulo
IX
Crash:
No Limite
(Crash
– 2004 – Dir.: Paul Haggis)
Trabalho
no estoque da empresa, sou acostumado a contar coisas. Numa cruzada de olhos,
naquela igreja, contabilizei aproximadamente uns 27 celulares sendo levantados
para filmar a cena, cinco pessoas sentando, três risadas, um desmaio, e um
Gerson bêbado no meio da igreja falando alto para todo mundo ouvir:
- Eu amo Joane, e sei que ela também me ama. Estamos nos
encontrando há meses e ela ficou grávida, e o filho é meu. Desde que descobriu
isso ela tem me ignorado, e vai deixar outro homem criar o meu filho como se
fosse dele. Tirou de mim seu amor e agora quer tirar o meu direito de pai. Não
vou permitir isso. Joane tem que ficar comigo, termos nosso filho e sermos
felizes.
Três
homens arrastaram Gerson para fora da igreja. Fred foi atrás e o convenceu a
sair dali, mas o estrago já estava feito. Os pais de Joane e Donnie foram
gentilmente pedindo aos convidados que se retirassem, enquanto Donnie estava
parado olhando para Joane no altar. O padre se retirou um pouco. Joane chorava
sem levantar o rosto, mas foi preciso quando Donnie perguntou se tudo aquilo
era verdade.
- Eu sinto muito, Donnie. Nunca quis te magoar. Não amo
o Gerson, mas eu havia bebido na festa da empresa e aconteceu, foi no calor do
momento e acabou se repetindo outras vezes. Então descobri que estava grávida.
Iria abortar, mas Vera e Gerson me impediram, e não tive coragem de te contar a
verdade. Eu sinto muito mesmo, e vou entender se não me perdoar. O que fiz foi
imperdoável mesmo.
- Eu até acho que consigo te perdoar, mas não aceitar.
Eu sinto muito mesmo pelas tuas escolhas, pois issoacabou com todos os planos
que tinha pra nós. Te desejo felicidades na sua vida, Joane, mas eu não vou
mais fazer parte dela. Boa sorte! – disse Donnie indo em direção á porta da
igreja, deixando Joane aos prantos no altar. Ele também chorava, mas
disfarçava. Tentei ir conversar com ele, mas ele me olhou e perguntou se eu
também já sabia. Não soube mentir. Falei que sim. Ele olhou pra todos nós com
cara de desprezo e disse que pensava que nós também fossemos amigos dele, e
então saiu.
Vera e
Lia foram ajudar Joane e depois de a acalmarem, levaram-na para a casa de Vera,
que acabou virando o ponto de encontro da turma. Em breve aquilo viraria uma
pensão! Gerson ainda foi a casa de Vera, mas Joane se negou a conversar com
ele. Então ele e Fred foram ao bar FRIENDS, e lá encontraram Donnie bebendo. Fred
ainda tentou convencer Gerson a ir para outro bar, mas Donnie já se levantava e
vinha em direção á eles.
- Sente comigo, por favor! Acho que precisamos
conversar. – disse Donnie para Gerson.
Os dois
conversaram muito e Fred só ouvia o desabafo de Donnie, a explicação de Gerson,
e aos poucos os dois foram conversando como dois amigos. Fred achou que aquilo
iria acabar em morte, e o que via era dois cara enganados pela mesma mulher se
tornando amigos. Um estava dando apoio ao outro.
Dois
dias haviam se passado e Joane já queria ir pra casa. Decidiu que voltaria á
vida normal. O emprego ainda estava lá, esperando por ela, mas para Gerson foi
diferente. Já no dia seguinte ele foi demitido. Vera estava á cada dia pior, só
ficava na cama, e sempre que possível eu ou Lia fazíamos companhia para ela,
que se negava á ir para um hospital. Robert ficou visivelmente abalado com tudo
e mostrou sinais de desiquilíbrio nesses dias, preocupando Lia. Numa noite em
que ele dormiu na casa dela, acordou aos gritos no meio da noite, falando que
Elisa estava ali, que estava brava por ele estar com outra. Lia começava á
ficar preocupada, mas seguindo o conselho de Vera, não tocou no assunto, pois
isso fazia parte da recuperação dele, bastava ela cuidar de ele tomar os
remédios direito. Liliam encontrou Trevor e ele pediu perdão, implorou, prometeu
mudar, mas ela não voltou atrás. André me procurou mais duas vezes e nunca
atendi. De Tom eu não tive notícias. Nesses meus últimos dias de férias decidi
não colocar os pés pra fora de casa.
Era meu
último fim de semana de férias, e eu estava cada vez mais confuso, perdido, e
começando a ficar triste por tudo o que ocorria á minha volta. Precisava sumir.
Decidi que iria passar uns dias na praia, numa pousada que adoro, onde passei
um fim de semana com Lia á alguns anos. Arrumei minhas malas, mandei uma
mensagem para Lia avisando e bati na porta de Tom para deixar Dexter. Ele
aceitou sem protestos, mas notei que ele estava diferente. Não fez nem uma
piada sem graça dele.
- Está tudo bem Tom?
- Sim... Claro, porque não estaria? – respondeu, mas não
conseguiu disfarçar.
- Você não vai criticar minha roupa? Nem reclamar do
Dexter? Nem um comentário sobre minha viagem? – perguntei tentando animá-lo.
- Não, você está bem vestido, pra variar. Dexter é uma
ótima companhia e te desejo uma boa viagem, mas preciso entrar. Até mais
vizinho! – fechou a porta, me deixando com cara de “que porra foi essa?”.
Joane
organizava as coisas para se mudar. A casa deveria ser vendida e ela tentaria
voltar para seu antigo apartamento. Gerson teve que abandonar o quarto que
alugava numa pensão por falta de pagamento. Seu dinheiro era pra beber, e isso
preocupou Fred, que o considerava um amigo, apesar de tudo. Fred o levou para
sua casa e o fez prometer diminuir a bebida e procurar ajuda. Gerson aceitou e
logo estava no grupo do A.A. Donnie voltava de uma viagem e decidiu procurar
Joane, eles deveriam resolver muitas coisas ainda, mas antes, precisava fazer
algo também importante. Vera melhorou muito nesses dias seguintes, e Robert
parou de ter visões e ataques de ansiedade. Lia o levou para conversar com sua
tia, a Dona Neusa, e ele adorou ela, que explicou muitas coisas pra ele e uma
forte amizade surgiu entre os dois.
Numa
tarde, Liliam foi ao mercado e Vera estava se sentindo tão bem que resolveu ir
trabalhar, quando um batida na porta a deixou sem chão. A polícia estava ali
para avisar que Liliam fora assaltada e estava no hospital. Havia sido esfaqueada
e corria risco de vida. Vera sabia o que havia acontecido. Decidiu que nada
falaria até ter novas informações. Correu para o hospital, e junto do irmão,
Robert, cuidaram de Liliam. Não conseguiram encontrar Tiago para avisar, pois
sabiam que Liliam não iria resistir muitos dias.
Quando
voltei do meu fim de semana da praia encontrei um Tom mais alegre, que se
desculpou pelo modo que falou comigo. Aceitei suas desculpas, peguei Dexter e
fui pra casa de Lia saber das novidades. Quando ela terminou de relatar tudo,
quem estava tendo um surto era eu. Merda! Eu acabei de voltar de um fim de
semana de descanso e descubro que Trevor tentou matar Liliam, que Joane voltou
pro apartamento, que Gerson é um sem-teto, e pare piorar André havia procurado
Lia e conversaram por mais de hora.
- Sabe Frank, acho mesmo que ele está tentando se
redimir de seus erros. Não estou dizendo que ele mudou ou que você deva voltar
pra ela, mas pelo menos conversar. Sabe que sou ótima em analisar as pessoas, e
notei sinceridade nas palavras dele. – explicou.
Eu não
devia, mas liguei pra ele e pedi para que fosse no meu apartamento á noite.
Assim que chegou nos sentamos, tomamos uma cerveja em completo silêncio enquant
ele brincava com Dexter e eu fumava um cigarro.
- Bem, eu tenho tanto pra te falar que nem sei por onde
começar. – começou ele – Primeiramente desculpe por tudo que fiz você passar. Foi desumano de minha
parte a forma como tratei você, mas hoje pude ver o erro que cometi e estou disposto
á fazer o que for preciso para que você veja que mudei.
- Ok, André. Eu te desculpo, embora boa parte da culpa
foi minha por ter insistido em tudo. Se tivesse coragem de ter terminado no
inicio, o sofrimento seria menor. Acredito que você tenha mudado, encontrado
Jesus ou sei lá o que, mas preciso de dizer: não tem a menos possibilidade de
voltar pra você. – disse, com firmeza na voz, tentando esconder um pouco de
mágoa.
- Entendo. Realmente entendo. Mas vou deixar o tempo
cuidar disso. Talvez um dia você resolva voltar pra mim, e eu vou estar lá, te
esperando. Só por favor, não demore muito, porque cada dia sem você me faz ver
o amor que eu joguei fora.
Assim
que ele saiu eu fiquei nas escadas olhando ele descer. Soube naquele momento
que não sentia mais nada por ele. Nem mesmo a mágoa existia mais. Tom abriu a
porta enquanto eu ia para meu apartamento.
- Está tudo bem? O teu macho está te incomodando? –
perguntou.
- Ele não é meu! E não, ele não me incomodou, só
conversamos e deixei bem claro dessa vez que não vou nunca voltar para ele.
- Por falar em conversar, será que podíamos conversar?
Aconteceu algo e bem , você sabe, não sou muito bom em me abrir com as pessoas,
e não tenho familiares próximos...
- Claro Tom! Eu estou sempre á tua disposição depois de
tudo o que você faz por mim e pelo Dexter. Quer entrar? – perguntei. E ele
entrou.
Nessa mesma noite Donnie foi
procurar Gerson na casa de Fred. Os dois resolveram procurar Joane no dia
seguinte para resolver a situação. Apesar de tudo, Donnie ainda amava Joane, e
Gerson queria apenas a chance de ficar ao lado do filho. Em um motel no canto
da cidade Gina não resistiu e teve sua primeira noite de amor com Steve,
ignorando o fato de ele ser casado. No hospital, Vera contava aos policiais a
verdade sobre Trevor e a certeza de que ele tinha atacado Liliam, que estava em
coma e não podia afirmar nada. Lia e Robert dormiam tranquilamente até ela
acordar com sons de vozes vindo da cozinha. Ao chegar lá, ficou ouvindo Robert
conversar sozinho, mas ela suspeitou que ele achava estar conversando com
Elisa. Chorando, Lia voltou para o quarto e ligou para sua tia Neusa, que
estava apavorada. Ao perguntar o motivo, Neusa falou ter entrado em contato com
Elisa, que afirmou que sua morte não foi acidente, que Robert não aceitou o fim
da relação e jogou o carro para fora da estrada.* Será que Robert não é quem demonstra? Descubra nas próximas semanas, nas quartas e sextas, ás 22h40min.
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