O Chamado Da Floresta
Por Patrick Lima Prade
Jack London foi um escritor que viveu entre 1876 e 1916 e se tornou popular com seus contos e livros sobre natureza e animais. Em 1903 ele lançou O Chamado Selvagem (também conhecido como O Chamado Da Selva e O Chamado Da Floresta), e desde então a obra foi adaptada para o cinema e TV mais de doze vezes desde 1908, sem contar as versões fora do circuito comercial ou independentes. A história é uma aventura cheia de perigos de um cão doméstico chamado Buck, que da noite para o dia se vê jogado no mundo. Esse ano, o diretor Chris Sanders, especialista em animações como Os Croods (2013) e Como Treinar o Seu Dragão (2010), arrisca a sua primeira tentativa com atores em carne e osso, e se saiu muito bem, embora o filme não seja a melhor adaptação da obra de Jack London.
O Filme
Buck é um grande e adorável cão doméstico que é roubado e vendido para puxar trenós no Alaska durante a corrida do ouro no fim do século XIX. Depois de suas aventuras entregando correspondências pelo gelo, Buck encontra o velho conhecido John, interpretado por Harrison Ford, de Indiana Jones (1981-2022) e Star Wars (1977-2019). Lutando com seus fantasmas pessoais, John leva Buck em uma aventura ainda mais arriscada em terras desconhecidas em busca de ouro. Nessa busca, ambos irão se encontrar. John na bebida e Buck com uma alcatéia selvagem que ronda a cabana de John todas as noites. Além disso, ambos são procurados por um garimpeiro em busca de vingança, que culpa John e Buck pela morte da esposa durante uma corrida de trenó. Esse é basicamente o enredo do atual filme, que apostou mais no lado “humano” do cachorro, e não tanto no lado “animal” dos humanos, como as versões mais anteriores ou até mesmo o livro, que na época da 2ª Guerra Mundial teve todas as cópias queimadas na Alemanha durante o regime nazista. Quem leu o livro ou viu o filme consegue entender o motivo claramente.
Animais Digitais
O principal diferencial desta versão talvez seja a criação 100% digital de todos os animais vistos no filme. Nenhum, nem mesmo os peixes, são reais. Não que fique difícil de perceber, ao contrário, fica evidente até demais, principalmente pelas expressões faciais do cão Buck, humanizado demais pra ser real, chegando até á sorrir em certas ocasiões. Lembrando que o ano era 1890 e os animais não eram tão adestrados ou acostumados ao convívio humano como hoje, por isso, ver Buck abrindo uma porta para jogar fora a garrafa de bebida de John parece cena saída do desenho Tom & Jerry. Isso tirou bastante a autenticidade da história, e até a emoção, tão comum em filmes de animais. Mas o produto final apresentado na tela agrada bastante, e a ausência de um cão real não é um motivo para desistir de assistir. O que faltou em O Chamado Da Floresta é justamente o tal “chamado” e a tal “floresta”, já que a história principal desta versão só acontece nos trinta minutos finais. Até lá não vemos lobos nem nada referente ao foco principal, o que torna esse mais um “filme de cachorro”, quando a proposta seria “uma aventura selvagem”. Faltou o selvagem. Talvez por causa dos direitos dos animais e pra conseguir a classificação de “Livre”, o filme tenha apostado mais nas confusões de Buck no que nas dores que ele sofreu.
Diferente Dos Semelhantes
Buck é personagem central da história: um cachorro domesticado obrigado á viver num mundo selvagem. Uma mensagem um tanto quanto atual, mesmo que o livro tenha mais de 100 anos, e que nos faz entender porque o livro foi proibido na Alemanha Nazista. Buck representa uma minoria numa terra de maioria, representa o civilizado numa terra da lei do mais forte, o diferente onde todos são iguais. Mostrar que é possível conviver entre raças diferentes na época onde tentavam aniquilar a raça mais fraca, deve ter causado polêmica e explica o fato do livro ter parado nas fogueiras. Até hoje em dia mensagens parecidas ainda são vistas com certo receio, mas nessa versão atual ela ficou um tanto velada, quase nula. Mas explicar para a humanidade que nós somos cachorros em terra de lobos ainda é difícil. Buck chegou com humildade, mostrando respeito e que acima de tudo se respeita e confia em si mesmo, e assim conquistou seu direito de ir e vir numa terra que não era dele. É assim que as coisas funcionam ainda. Mesmo um século depois de seu lançamento, ainda reina a lei do mais forte, já que a humanidade anda ‘á passos de formiga e sem vontade’.
Conquiste Seu Lugar!
Mas O Chamado Da Floresta ensina que há lugar para todos aqui, desde que você se conheça como Buck, o cão selvagem, conheceu a si mesmo e ao seu potencial quando precisou lidar com as adversidades do caminho até seu novo lar. Ele não tentou á força, ele não brigou, ele simplesmente se mostrou como era por dentro: um lobo civilizado. Então não fique reclamando da vida e das faltas de oportunidades que ela não ofereceu. Vai lá e se adapta ao mundo, mostra que você consegue ser um lobo civilizado também. O mundo não gira ao redor do nosso umbigo! Infelizmente ainda estamos atrasados nesse ponto: se você é um cão no meio dos lobos, você precisa se adaptar aos lobos e não o oposto. Querer que o mundo como conhecemos hoje, evolua num piscar de olhos e todos os lobos passem á agir como cães domésticos é uma utopia quase infantil. Se você é um cão e encontra uma alcatéia selvagem, não é latindo alto que eles vão te ouvir. Você será devorado, ou na melhor das hipóteses, apenas excluído. Mas se você agir com respeito (respeito próprio também conta!) e se habituar ao seu novo lar, aonde você quer estar, você precisa aceitar principalmente que a maioria dos lobos nunca vai aceitar em unanimidade que um ser civilizado faça parte de seu grupo. Não perca sua humildade, não se entregue, apenas aprenda á uivar!
Direção: Chris Sanders
Elenco: Harrison Ford, Osmar Sy, Cara Gee e Dan Stevens.
Trailers:
Legendado - https://www.youtube.com/watch?v=3kMHTbr5g68
Dublado - https://www.youtube.com/watch?v=Emz8qlKhFDA
Texto originalmente publicado no Jornal Do Povo no link:
https://www.jornaldopovo.com.br/site/blogs/573/304014/O_Chamado_Da_Floresta.html
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